ALÔ, ALÔ, CHAMANDO, por Eduardo Haak

WESLEY DUKE LEE Wesley, 1931-2010, fez sua primeira exposição individual numa galeria no Conjunto Zarvos, em 1963. A cena em que Gabriele Tinti dá o bilhete azul (receita de Rivotril?) para a namorada sem graça em Noite vazia, Walter Hugo Khouri, 1964, foi rodada no Conjunto Zarvos, Avenida São Luís, 258. O mezanino e a escada rolante que aparecem em destaque no filme ainda estão lá. Caindo aos pedaços, como tudo no Centro. Olhando friamente, Wesley fez por aqui as mesmas coisas que Robert Rauschenberg fazia em Nova York, mais ou menos na mesma época. Uns troços com pneus carecas, entulhos, raquetes de tênis espatifadas, etc. A despeito disso, Wesley desenhava bem e dava pra perceber em seus trabalhos a agudeza e a exuberância de sua personalidade. Em entrevistas e em declarações públicas era insuperável. Arrogante, rude (e refinado, uma combinação incomum), engraçadíssimo. Era bonito e, explicitamente, um homme à femmes. Claro que seria canceladíssimo hoje. Seu feito mais objetivo foi ter sincronizado a mentalidade artística brasileira com o que então se passava nos mais avançados centros produtores de cultura. De tempos em tempos aparecem uns sujeitos assim, que fazem do Brasil um país menos provinciano. (Júlio Barroso, 1953-1984, desempenhou mais ou menos esse papel na música pop brasileira.) Não sei dizer se o saldo disso tudo compensou. Os dez mil “artistas” que as FAAPs da vida despejam por ano no mercado são Wesleys de quinta mão, quase sempre capiaus aportados em São Paulo que desconhecem a fonte de tudo que mimetizam. (O que há sessenta anos era surpreendente e transgressivo hoje é clichê rotinizado, etc.) No mais? No mais estou cagando para esse assunto desde 1993, quando vi na Bienal a pilha de palitos de fósforos do Cildo Meireles e a parede forrada com sacolas da Jac Leirner, obra essa que um monitor da Bienal que era uma mistura do Clodovil Hernandes com o Leão Lobo “explicava” para um grupo de crianças pequenas, excursão de escola, todas sentadinhas com as pernas cruzadas, etc.

CEMITÉRIO DA QUARTA PARADA DURA A coisa aqui no Quarta Parada Dura não anda moleza, ô meus. Os violadores de sepultura não dão trégua. Roubam até flor murcha. Foi o Mussum, com quem divido o túmulo do samba, quem me deu a dica, “vai lá e fala com o Jacíntis, Homem do Sapátis Brânquis”. (Esse Mussum está mais pra Seu Creysson, mas o.k.) Jacinto Figueira Jr., como todos sabem, está sepultado aqui. Quando vivo foi um comunicador que se dedicou a denunciar as injustiças e as violações. Morto devia continuar o mesmo, deduzi. Então fui até o túmulo do Jacinto. E – ó, que surpresa – o túmulo estava sendo violado. Os ladrões queriam levar os sapatos brancos do Jacinto. E Jacinto, uau!, estava tentando negociar com os elementos. (Não está muito diferente, o Jacinto. Apesar de ter se transformado num zumbi, sua expressão continua igual.) “Ô lindôs, esses meus sapatos são de estimação, por que não levam minha dentadura?”, ofereceu Jacinto. A negociação não deu certo e Jacinto, além de descalço, ficou banguela. Os ladrões levaram a dentadura. “Perdeu, playboy”, disseram os ladrões, gargalhando, antes de se evadirem. “Pense positivo, Jacintaço, ainda te sobrou o caixão”, eu disse, tentando lhe dar algum consolo. E prometi fazer uma rifa para repor os itens roubados. E tive a ideia de produzir uns novos programas do agora cognominado Jacinto Figueira Jr., o Zumbi do Sapato Branco. Já rodamos um piloto e a coisa está na fase de negociação com possíveis patrocinadores. Aguardem que vem coisa boa. Em breve nas melhores casas da banha e nas melhores casas do rambo, programado para matar. Vai um chopps e dois pastel aí? 

ZUMBI E aí, patrulheiros, quando vão começar a implicar com a palavra zumbi, dizendo que ela estereotipa e reduz a religião vodu haitiana a uma fábrica de mortos-vivos, além de aviltar a memória do Zumbi dos Palmares?

CAPAS DE PLAYBOY QUE NÃO EXISTIRAM, MAS QUE MERECIAM TER EXISTIDO Virginie Boutaud, em qualquer mês de 1986. Quem é coroa sabe, ô se sabe, quem é a Virginie do Metrô. E sabe o estrago que uma Playboy com ela teria feito quarenta anos atrás. 

CAPAS DE ELE & ELA QUE EXISTIRAM, MAS QUE FORAM INJUSTAMENTE ESQUECIDAS Patrícia Scalvi, em algum mês de 1987. Dentre as musas da Boca do Lixo, Patrícia sempre teve uma atuação mais discreta e assumidamente coadjuvante, embora ela tivesse lenha de sobra pra queimar como protagonista. Bela e excelente atriz. Vejam o episódio protagonizado por Patrícia e por Arlindo Barreto (“Bozo era movido a cocaína na TV”) em A noite das taras, 1980, e tirem suas conclusões. (Quem tiver a Ele & Ela com ela na capa digitalize e me mande, s'il vous plaît.)

PIADA VELHA Clodovil: Clô para os íntimos, vil para os desafetos e dou para todos.

(04/09/2023)