QUEM BATE CARTÃO NÃO VOTA EM PATRÃO, CONTRA BURGUÊS VOTE 16, ETC. Nunca tinha ouvido falar em Maria Homem. Sei lá como cheguei a um vídeo dela no Instagram. (Algoritmos, etc., etc.) Maria é uma figura enfadonha, sem charme algum, que só diz platitudes. Era mulher do Contardo Calligaris, que uns vinte anos atrás era um badalado comentador, pelo viés psicanalítico, de nossas desgraças, etc., etc. (Uma vez, lá por 2005, eu estava com a Gisela Rao no Frevo da Augusta e ela foi falar com o Contardo. Faço terapia com ele, justificou. Pensei, ingenuamente, puta que pariu, onde é que ela arranja dinheiro para pagar terapia com esse figurão? Dinheiro, dinheiro mesmo, eu sabia que a Gisela não tinha. Eu ainda não entendia como funciona a coisa do capital simbólico, não sabia que esses comunistas de merda vivem à base disso, e de rapapés, e de intermináveis trocas de favores. O que o Contardo não cobrava da Gisela Rao ele certamente compensava cobrando os tubos de alguma paciente perua burguesa idiota, porque burguês, oras, burguês tem mais é que se foder mesmo.)
BURGUÊS TEM MAIS É QUE SE FODER MESMO, ETC. Estamos em 2017. Vou com o Roberto Bicelli, que segundo o Chacrinha é o maior poeta vivo do Brasil, e com o entourage do maior poeta vivo do Brasil ao D’Amico Piolim. Sei que o Piolim é um restaurante caro à beça, portanto vim prevenido. Na hora de pagar a conta, quase caio pra trás. Desconto de 80%. Pergunto ao Bicelli o porquê daquele desconto. Ele dá uma resposta vaga. Pergunto se é uma gentileza entre comunas, pros camaradas desconto de 90%, pra burguês deslumbrado metido a boêmio acréscimo de 300%. Bicelli não diz nem que sim, nem que não, portanto é claro que é.
WALTER HUGO KHOURI Júlio Barroso, o Safardana, antecipou sua volta ao Brasil trazendo na bagagem um monte daqueles chapéus de camponês vietnamita pra distribuir entre os amigos e um monte de bonecos de vodu para distribuir entre os inimigos (como todos sabemos, o Vietnã é a terra da religião vodu, cujo sumo sacerdote é o compositor de valsinhas e calcinhas eletroacústicas Alfredo Stroessner). Disse pro Júlio que estava saindo com uma gata que andava precisando trabalhar, que ela estava com o condomínio do túmulo no Araçá atrasado, etc. Perguntei se ele ainda tinha algum contato com o Walter Hugo Khouri, o diretor de cinema. Júlio perguntou, todo empolgadinho, quer dizer então que ela é bonita? Eu disse que era, mas que não era pro bico dele. Bonita, jovem (nascida em 1957, morta em 1982, vinte e cinco anos, portanto), fotogênica. Júlio disse que ia contatar o Khouri. Etc., etc. O fato é que ele contatou mesmo, o Khouri respondeu, a gente levou a Vera lá e o Khouri contratou-a na hora para trabalhar em cinco filmes e lhe deu um adiantamento de cinco milhões de dólares furados, que é a moeda corrente no mundo dos mortos eppur si muove. Vera pagou o condomínio atrasado, resolveu restaurar a Variant II na qual ela morreu num acidente e anda toda empolgada com a perspectiva de vir a ser a nova musa da Boca do Lixo, ou melhor, a nova musa da Boca do Necrochorume.
Bem-bem-bem, meus camaradas, é tarde, eu já vou indo, preciso ir embora, na próxima eu conto mais, tchau.
CAOLHO DOS ARCOS, ETC. “Não procurei o Urubu, nem o Borracha, nem o Zé Pára-Lama, nem o Caolho dos Arcos, nem o Manquitola do Rio Comprido, nem o Manivela da Voluntários, nem o Belzebu dos Infernos, esqueci o automóvel e fui dormir. Pela minha imaginação desfilava um lúgubre cortejo de tipos grotescos, sujos de graxa, caolhos, pernetas, manetas, desdentados, encardidos, toda essa fauna de mecânicos improvisados que já tive de enfrentar, cuja perícia obedece apenas à instigação da curiosidade ou à inspiração do palpite, que é a mais brasileira das instituições.” (Trecho de A quem tiver carro, de Fernando Sabino.)
03/08/2025