ALÔ, ALÔ, CHAMANDO, por Eduardo Haak

TEMPO DO ONÇA Sempre me pergunto por que "o" onça, artigo definido masculino. E terá esse onça algo a ver com once, "once upon a time"?


MÁ VIU, LINDÔ Ainda não li a biografia do Jacinto Figueira Jr., O Homem do Sapato Branco, escrita por Maurício Stycer, mas pelas entrevistas concedidas pelo elemento desconfio que ele não captou o essencial do biografado - o humor, o deboche, a ironia, o pendor para o non sense. Jacinto foi um notável protagonista da estética da violação e do mal-estar que entrou nos usos e costumes do Ocidente a partir dos anos 1960, mas sobretudo dos 1970 (e que foi moeda corrente entre nós até os primeiros anos do século XXI). Enfatizar em Jacinto "o homem que introduziu o mundo-cão na TV brasileira" é uma simplificação simplória.


COMANDO DA MADRUGADA Na verdade todas as figuras de destaque na mídia, no período que citei, exploraram a estética da violação e do mal-estar. (Quem não vê a continuidade entre "o mundo-cão na TV" e o ideário de grupos artísticos então radicais como o Fluxus - Joseph Beuys, etc. - é mulher do padre.) Lembro-me de um programa do Chacrinha em 1982 em que houve um concurso de quem comia mais bananas. A imagem de um sujeito obeso, suando frio, fazendo sinal de positivo, mastigando a quadragésima banana enquanto um médico tirava sua pressão me vem claramente à memória. Um caso de bestialidade narrado pelo Afanásio Jazadji, ele fazendo a suposta voz do animal implorando ao tarado, "vem, Terto, vem…". Goulart de Andrade mostrando travestis fazendo aplicações caseiras de silicone industrial (ou exibindo os cadáveres podres de PC Farias e da namorada sendo autopsiados). Em suma, coisas que estavam mais para happening e perfórmance do que para jornalismo informativo.


SUPLA E OS PUNKS DE BUTIQUE Divertidíssimo o nome da nova banda do papito. Outro dia me lembrei da banda Os Excomungados, especificamente da canção "Union Carbide dá amostra grátis pra dois mil na Índia". A canção se refere ao vazamento de um gás altamente tóxico ocorrido numa fábrica da Union Carbide em Bhopal, Índia, em 1984, que matou dezenas de milhares e sequelou sabe-se lá quantos.


COMPOSITORES O idioma inglês faz a distinção entre o camarada que escreve canções, songwriter, e o tovarisch que lida mais diretamente com claves de sol, bemóis, sustenidos, etc., esse, sim, o composer. Faz sentido e, às vezes, faz muito sentido. Sempre tenho vontade de rir quando qualquer Zé Mané que fica lá, proclamando suas frustrações amorosas numa musiquinha com dois acordes, é apresentado como compositor.


LOBÃO E HERBERT Eu tenho um palpite nunca aventado sobre a implicância do Lobão com o Herbert Vianna (superada, ao que parece). Observem as canções de amor dos dois. O discurso do Herbert é aquele interminável chororô do sujeito que não pega mulher nenhuma. Já o discurso do Lobão é o do homem autoconfiante que sabe que suas blandiciosas palavras de sedução vão colar, sempre. Indo no popular, Herbert é o Waldick Soriano e Lobão, o Wando.

 

CAPAS DE PLAYBOY QUE NÃO EXISTIRAM, MAS QUE MERECIAM TER EXISTIDO Graziela Gonçalves, em qualquer mês de 2006. Graziela é a viúva do Chorão, CBJr. Além de bonita, tem um jeito vibrante e despachado que me agrada muito. Vou com a cara da moça.


FILMES QUE NÃO EXISTEM, MAS QUE MERECIAM EXISTIR "Cancelamento", direção de Walter Hugo Khouri, 2023. Marcelo está envolvido com Ana, uma assessora de imprensa que só chega ao orgasmo quando é esbofeteada e xingada com determinados insultos na cama. (Os insultos são, para a sensibilidade contemporânea, B.O. total.) Marcelo se desinteressa por Ana ao conhecer Berenice, uma alpinista que ele conhece no Pico das Prateleiras, Itatiaia, RJ. Ana se vinga da rejeição de Marcelo acusando-o publicamente disso e daquilo (violência doméstica, etc.). A reboque de Ana, dezenas de mulheres aparecem fazendo a Marcelo acusações semelhantes (violência, assédio, estupro), o que faz ele acabar sendo preso. Algum tempo se passa ("corte de continuidade", na terminologia de roteiro cinematográfico). Ana, apesar de tudo, ainda é intimamente apaixonada por Marcelo. Decide então corromper um agente penitenciário para que possa fazer, com identidade falsa, visitas íntimas ao ex no presídio. Após alguns encontros íntimos pautados pelo constrangimento mútuo, Ana finalmente se solta e implora a Marcelo, "me bata, me xinga daquelas coisas todas". Fim.


PIADA VELHA Qual a diferença entre a mulher e o disco (de vinil)? É que o disco você põe no buraquinho pra ele cantar e a mulher você canta pra pôr no buraquinho. (No embalo dessa, vai outra, tirada de um dos discos do Costinha: mulher (feia) é que nem violino, você vira a cara e taca a vara.)

(30/07/2023)